domingo, 21 de outubro de 2012
Caprichos
Qualquer casa organizada pelo amor de minha mãe
Qualquer filme de cinema visto em boa companhia
Qualquer linha de poema recitada com verdade
Qualquer conversa sem rumo fluindo entre companheiros
Qualquer lágrima enxugada pelos lábios da escolhida
Qualquer momento vivido que permita mais saber
Qualquer erro cometido em nome da lealdade
Qualquer escolha impulsiva nas ditaduras do "certo"
Define precisamente meu requinte de viver
sábado, 13 de outubro de 2012
Amostra
A semente abre
devagarinho;
pétalas incipientes se insinuam
para a doce luz
por alguns segundos.
Até que o meteoro tromba,
massacrante,
matando essa semente
e toda a metade do planeta
em que o espírito se atrevia.
segunda-feira, 8 de outubro de 2012
Muitas vezes
Muitas ideias,
poucas palavras,
nenhum proveito.
Muitos caminhos,
poucas passadas,
nenhum percalço.
Muitas pessoas,
poucos amigos,
nenhum banquete.
Muitos fatores,
poucos quereres,
nenhum pecado.
sábado, 6 de outubro de 2012
Tanto
Feche os olhos,
conte até três.
Quando abri-los,
estamos namorando;
Pense em algo
com toda força.
Quando parar,
está bem na nossa frente;
Diga um nome
bem devagar.
Quando acabar,
eu também o pronuncio;
ainda.
conte até três.
Quando abri-los,
estamos namorando;
Pense em algo
com toda força.
Quando parar,
está bem na nossa frente;
Diga um nome
bem devagar.
Quando acabar,
eu também o pronuncio;
ainda.
sábado, 29 de setembro de 2012
Existencialista
O ato não está,
ninguém o localiza.
Mas não fica solto no ar,
nem brisa;
não estala na brasa a fritar,
nem cinza.
O ato não está,
mas firma seu lugar
na hierarquia:
do alto do abstrato da utopia,
é ele quem vai nos guiar
a pontaria.
sábado, 22 de setembro de 2012
Vitamina ser
Se o poderoso é cruel
e o cidadão é laranja,
já há remédio político:
a força de mãos calejadas
tem de espremer o laranja
até tirar ácido crítico.
quinta-feira, 13 de setembro de 2012
O salto mortal
Adalberto trancou a porta do banheiro
para poder chorar copiosamente.
Eram em vão as tentativas de imitar
o salto mortal executado
por seus ídolos dos filmes de Hollywood.
Enquanto Adalberto chorava sozinho
homens proclamavam o ódio contra nações,
e nações devolviam o ódio em bombas.
Conspirações atingiram embaixadas mundo afora,
reações foram cobradas e rapidamente
posicionaram-se os líderes dos gigantes armados.
Pessoas saíram às ruas perdidas
pedindo desculpas pelo que não tinham feito,
mas as bombas que rugiam na queda inevitável
eram surdas.
Aqueles que ajudavam, arrependiam-se de ajudar
quando os ajudados tomavam seus parcos tetos
e expulsavam sem cerimônia suas famílias.
Os que odiavam armas eram poupados mais alguns segundos,
mas eram meros instantes antes que se afogassem na tragédia.
Armas químicas cruzaram o céu da metrópole,
e o sol nasceu na noite, e nasceu verde,
e uma chuva refrescava as peles derretidas
daqueles que imploravam pelo fim de seu martírio.
Mísseis derrubavam prédios sobre prédios,
e um a um todos os abrigos voltavam ao pó primário.
A cada acerto de mira
membros arrancavam-se de corpos e cabeças
despedaçavam-se em partículas de crânio
que há poucos segundos consciência comportavam,
e agora mal serviriam aos cães.
Mas nem os cães eram poupados, e na sangria atômica
de seus intestinos expostos ao calor de mil graus,
reconfortavam-se criaturas de esgoto (agora refúgio)
tingindo-se do sangue em chamas e da cor da vida em putrefação.
Quando Adalberto acabou de chorar
já não havia ruídos lá fora.
Ele abriu a porta e caminhou pelo que restava da casa,
firme e decidido, cruzou as poucas vias secas de chorume,
pisou nas poucas pedras não estraçalhadas das avenidas,
tomou cuidado de não tropeçar em nenhum dos corpos mutilados pelo chão,
e chegou à antiga quadra pública, agora sopa de destroços,
onde ainda se viam sombras com mãos erguidas e olhares desesperados.
Cerrou os olhos vermelhos, cerrou os punhos de raiva,
mirou um espaço vazio caminhável, deu dez passos para trás,
correu sentindo um arrepio subir à garganta,
saltou,
rodou no ar uma vez,
percebeu o completo do giro,
sentiu seus pés firmes no chão no retorno.
Perfeito!
Ele conseguira!
Agora, fazia parte de um grupo seleto;
agora, honrava todos os esforços de uma vida;
agora, era digno de ter um nome nos anais,
um exemplo de superação e autoestima.
Igualara-se aos heróis do mundo atual,
e, sabendo disso, emitiria
um atordoante grito de realização,
alegria, conquista, plenitude.
Pena que já não havia mais ninguém para ouvi-lo.
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