sexta-feira, 27 de abril de 2012
Matemática do sentido
Você pode beber meio copo de água,
comer meia fatia de bolo,
brindar com uma meia-cerveja.
Você pode ter um meio-amigo,
um meio-irmão, dizer uma meia-verdade,
ter mais ou menos confiança,
andar mais ou menos que a metade
ou o terço ou dois terços
da estrada que escolheu.
Você pode ter nenhuma,
pouca,
muita
ou gigantesca
atração ou repulsão, concordância ou discordância, aceitação ou recusa.
Você pode numerar amigos,
numerar façanhas,
numerar vantagens,
colocar na balança ditos e feitos,
fazer a média entre erros e acertos,
fazer o balanço entre avanços e recuos,
calcular o saldo final entre lisuras e vilezas.
Você pode fixar um valor até para seus valores,
criar meios para aumentar o valor dos valores,
criar meios-valores para aumentar os valores,
criar valores para os meios de aumentar os valores.
Mas quando você toca uma vida, meu querido,
você não toca meia vida,
não toca um quarto de vida,
nem três oitavos de vida,
nem dois vinte e dois avos de vida.
Quando você toca uma vida
é ponto final na oração.
Basta uma pomba branca
para dizer: nem toda pomba é cinza.
Basta um sonho vivido para dizer:
nem todo sonho é quimera.
(A intangibilidade do texto artístico
- barreira à fruição total sem todo -
também é própria do texto-vida,
primor de escrita em linhas tortas.)
Não importa a extensão,
o tempo total do percurso,
a feição da meta no horizonte -
quando você cruza um caminho,
vira parte do caminho.
Basta que uma única vez
perdida na história do corpo
um coração tenha batido
mais forte por sua causa
para que toda a vida vivida
tenha cumprido a função de meio
de alcançar um sentido só sentido
por inteiro.
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2 comentários:
precisei tomar fôlego para continuar lendo!!!!
parabéns grande mestre!!!
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