domingo, 27 de dezembro de 2009

A fonte inesgotável

I

O sangue, a bílis, a linfa, o suor,
a saliva e a lágrima do seu corpo
poros da terra absorveram como água.

Parte dessa água nutriu raiz de planta,
floriu, frutificou nos ramos,
voltou ao corpo dos bichos na fome.

Parte dessa água fez-se clima,
lubrificando a pele das criaturas
que a natura criou co'aval de Deus.

Parte dessa água foi aos céus de novo
em nuvens que velaram das alturas
por montanhas, vulcões, campos, aldeias.

E do alto a chuva redistribuiu
a água do ser que um dia foste
por terras tantas que jamais soubeste.

II

Mas parte dessa água absorvida
secou na terra, se prendeu aos poros,
parou no tempo e se tornou reserva.

Essa parte de água que tu foste
não carreou vida, não voltou da morte,
não evaporou para além, como uma alma,

não circulou pelo mundo evaporada,
não se refez no ciclo hidrográfico,
não cogitou de voltar à ativa,

simplesmente optou por integrar-se
à química do imóvel, do estático,
recolhendo-se em silêncio de elemento.

Essa parte da água que tu foste,
e só essa, esquecida e quase nula,
é que pode ser chamada doação.

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